Síndicos eternos: por que muitos não aceitam deixar o cargo?

Síndicos eternos: por que muitos não aceitam deixar o cargo?

Motivos podem ser variados, mas uma coisa é certa: os moradores podem fazer valer o direito de destituir quem extrapola no exercício das funções

 

Moradores do Condomínio do Edifício Mont Serrat, no Gutierrez, região oeste de Belo Horizonte, passam por uma situação inusitada, mas não incomum. Lá, depois de cerca de 20 anos de três proprietárias se revezando a frente do condomínio, os moradores elegeram uma condômina nova no prédio. No entanto, a síndica Emília Infante não pode assumir suas funções, já que um dos moradores contestou a eleição na Justiça. Ela conta que quando chegou ao prédio percebeu que o edifício estava decadente, precisando de reparos. Também notou que as síndicas anteriores não prestavam contas das gestões e sempre se elegiam por meio de várias procurações. Ela então reuniu os condôminos insatisfeitos, que convocaram uma assembleia para destituição da síndica anterior e eleição da nova. Ainda assim, segundo ela, um morador amigo das síndicas anteriores contestou a eleição e entrou com ação na Justiça para anular a assembleia. “Não entendo porque não querem deixar o mandato de síndicas. Suspeito que haja alguma irregularidade”, diz Emília. O Jornal do Síndico procurou uma das ex-síndicas, que hoje é subsíndica, mas ela não quis falar sobre o assunto. Disse apenas que o caso corre na Justiça.

 

Segundo o advogado especializado em direito condominial, Márcio Monteiro, uma das razões que levam síndicos a não quererem deixar o cargo é o gosto pela sensação de poder que sentem ao se verem como a pessoa que “determina a vida do condomínio”. Ele conta que já viu muitos casos de “panelinhas” ou rodas de convivência que se formam em torno do síndico e que fazem com que ele não queira perder o título.

 

Essa noção é percebida no dia a dia pelo proprietário da administradora LMX e síndico profissional, Leandro Martins. Segundo ele, moradores reclamam que tem síndico que se sente “dono do prédio”, não aceita opiniões e tem postura autoritária. “Tive um caso de condôminos reclamando que o síndico não fazia nenhuma melhoria no prédio, que estava acomodado e mesmo assim, não queria deixar o cargo”, diz ele. Só que, ainda de acordo com o dr. Márcio, este não é o motivo principal do apego ao cargo.

 

O advogado explica que na maior parte dos casos é a remuneração que o síndico recebe o maior atrativo para segurá-lo no cargo. “Recentemente nós representamos um condomínio que o síndico estava há mais de 20 anos a frente do prédio, com remuneração de R$ 15 mil”, conta o advogado. Ele diz que em muitos casos, o síndico “se apega à remuneração, considera aquilo incorporado no seu orçamento e não quer perder”.

 

Outro motivo – e esse bem mais grave -, é a barganha que muitos fazem com fornecedores e prestadores de serviço. O advogado diz que já atuou em casos em que os moradores descobriram que o síndico, ao contratar um prestador de serviço ou fornecedor, condicionava este contrato a realização de serviços no seu próprio apartamento, sem custo. “Alguns compram produtos de limpeza para o prédio e ficam com uma parte para eles”, afirma Márcio Monteiro.

 

Diante deste cenário, tanto o advogado quanto o administrador concordam que o ideal é a mobilização dos condôminos. “Os moradores precisam entender que o prédio é a casa deles. A maioria não entende isso. Não tem o conceito de que tem que cuidar daquilo como se fosse a casa deles. Acham que é só da porta do apartamento para dentro. É como se o dinheiro que ele paga da taxa de condomínio fosse de ninguém. Se a pessoa que está lá (como síndico) constata que ninguém está olhando, faz o que quer”, alerta o dr. Márcio.

 

Para resolver o impasse, Leandro recomenda que os moradores primeiro conversem com o síndico, explicando a insatisfação com o trabalho dele. Se ele não aceitar deixar o cargo voluntariamente, os moradores devem convocar assembleia geral extraordinária, com assinatura de ¼ dos condôminos. Para a destituição, é preciso quórum de 2/3 dos moradores. Para os prédios que tem contrato com alguma administradora esse processo é menos penoso, já que, segundo Leandro, a empresa vai trabalhar com profissionalismo, poupando o desgaste entre vizinhos. “Muitas vezes o síndico leva para o lado pessoal”, diz ele.

 

Na maioria dos casos apenas a destituição serve de punição para o síndico que não exerceu bem o seu papel. Mas nos casos de barganha, como explicado pelo dr. Márcio, pode até caber ação criminal. “Se for constatado apropriação de valores e adulteração de notas e recibos, o síndico pode responder a processo criminal”, avisa o advogado. Neste caso, ele responde por estelionato e apropriação indébita, crimes que somados, tem pena que variam de um a cinco anos de prisão e ressarcimento dos valores devidos. Mas, ele lembra que para fazer essa acusação, são necessárias provas. “Tem que ficar demonstrado que o síndico não está cumprindo com suas obrigações, como não prestação de contas ou que ele pratica alguma irregularidade, como a barganha. Quem acusa tem que ter as provas”, conclui.