Barulho de obra tem limite

Barulho de obra tem limite

Por Kênio de Souza Pereira

 

As pessoas têm o direito ao sossego, sendo o silêncio essencial para que ocorra o descanso, bem como para estudar e trabalhar. Poucos sabem que há leis que estabelecem limites de ruídos até mesmo para as construtoras que causam grande incômodo aos vizinhos.  

 

Os ruídos e as vibrações em excesso provocados por algumas empresas, bem como a fumaça decorrente das chaminés dos restaurantes e churrascaria, às vezes são inevitáveis, mas a lei exige que tais incômodos devem ser amenizados por meio de vários tipos de soluções, como revestimentos acústicos, barreiras de som, filtros e demais materiais e equipamentos para que seja possível a convivência.

 

Caso a empresa não respeite as leis que promovem a boa vizinhança, qualquer vizinho tem o direito de procurar um advogado especializado para que esse tome as providências jurídicas, pois os ruídos e demais excessos, além de desvalorizarem os imóveis no entorno, causam prejuízos aos vizinhos que deixam de produzir ao não poderem descansar, bem como os adoece.

 

A saúde não tem preço e esperar pela ação da Prefeitura tem gerado grande frustração, pois essa recebe milhares de reclamações, não tendo condições de resolver essas irregularidades com celeridade. A tramitação desse processo demora anos, sendo comum os incomodados desistirem de esperar uma solução por parte do poder público, o que motiva as providências junto ao Poder Judiciário que é mais eficaz.

 

Em relação a atividade de construção civil essa não tem como ser tolhida, pois é notório que toda obra causa incômodos. Mas, em parte, nesse tipo de atividade há regras especiais. As construtoras e empreiteiros têm o direito de trabalhar normalmente, dentro dos limites da Lei nº 9.505/2008, que define o controle de ruídos em Belo Horizonte. O Alvará de Construção tem sua vigência condicionada ao respeito ao Direito de Vizinhança, o que implica que não permite que as construtoras pratiquem atos ruidosos acima dos limites legais, nos termos do art. 8º da lei.

 

Limitações – Não há alvará que autorize alguém a perturbar, a prejudicar os vizinhos ou causar danos aos muros, às casas e prédios localizados no entorno da nova edificação e, por saberem disso, as construtoras exercem sua atividade com cuidado para evitar qualquer reclamação das pessoas que residem ou trabalhem ao redor da obra. Inclusive, cabe ao construtor, antes de iniciar a obra, entregar o Laudo de Vistoria da casa/prédio vizinho, que demonstre o seu estado atual, devidamente assinado pelo perito/engenheiro e pela construtora, pois caso a nova construção cause danos, este documento será a prova do que deverá ser consertado pela mesma.

 

Portanto, a construtora tem o direito de edificar, não podendo os vizinhos criar obstáculos, mas têm o direito de serem indenizados se sofrerem algum dano, como por exemplo, trincas nas paredes ou piso em decorrência do bate-estaca.

 

Por ser a construção civil geradora de riquezas e progresso ao empregar milhões de trabalhadores, essa atividade não sofreu interrupção em decorrência do coronavírus. Entretanto, continua a ser proibida a utilização de serra circular, martelo, makita, furadeira, martelete e demais equipamentos que causam ruídos acima de 70 decibéis antes das 10h00. É compreensível que os vizinhos fiquem incomodados com a poeira, o barulho e a invasão de privacidade que atingem sua moradia, mas por ser impossível realizar uma obra silenciosa é necessário ter tolerância.

 

Incômodo – A ninguém é dado o direito de prejudicar a saúde, o sossego ou de causar incômodo de qualquer natureza, conforme estabelece o art. 2º da Lei 9.505/2008 e o art. 1.277 do Código Civil, mas nas áreas urbanas torna-se necessário ponderar o direito ao trabalho com o direito à saúde, o que é plenamente possível e racional.

 

Diante disso, qualquer empresa, como bares, boates, academias, salão de festas, canis, clínicas veterinárias, marcenarias, oficinas de automóveis, dentre outras, devem executar suas atividades sem perturbar os vizinhos, pois caso promovam poluição sonora ou ambiental, seja a qualquer hora do dia ou da noite, poderá vir a ser acionada pelo vizinho prejudicado. É direito de qualquer cidadão exigir a eliminação dos atos ruidosos e que geram incômodo além dos limites da lei.

 

Multa – O construtor e o engenheiro têm o dever de fazer o cronograma de obras de maneira que os ruídos, que não possam ser confinados, sejam produzidos somente entre 10h00 e 17h00, de segunda a sexta-feira.

 

Caso a construtora ignore esses limites, qualquer pessoa pode denunciar ao órgão de fiscalização do município. Por esses equipamentos provocarem ruídos entre 98 a 112 decibéis, ultrapassam 40% em relação ao limite legal, o que resulta na aplicação de multa por infração gravíssima. Essa multa será de R$5.500,00 a R$10.000,00, que diante da reincidência pode triplicar, ou seja, chegar a R$30.000,00 e, caso persista o problema, resultará na interdição da obra.

 

Em geral, os construtores agem com sabedoria por procurarem os confrontantes antes de iniciar a obra, para avisa-los que estão à disposição para sanar qualquer incômodo, pois sabem que o risco de receber uma fiscalização é enorme. Diante da apuração da denúncia, o Fiscal, ao perceber alguma outra irregularidade na obra – que não tenha relação com os ruídos – poderá interditar a atividade e até cassar o alvará, o que acarretará um dano muito maior do que se tivesse tido consideração com a vizinhança.

 

*Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG (2010 a 2021) –

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal –

Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG – Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis –  kenio@keniopereiraadvogados.com.br