Revisão do Código Civil promete mudar regras de convivência nos condomínios

Revisão do Código Civil promete mudar regras de convivência nos condomínios

Por André Resende – Jornalista

Publicado em 07/08/2025

A rotina de quem mora e trabalha em condomínios pode mudar significativamente caso avancem as discussões do novo Código Civil em tramitação no Congresso Nacional. Entre os pontos que mais chamam atenção estão a possibilidade de expulsar moradores antissociais após decisão em assembleia, limitar locações por plataformas como Airbnb e aumentar o teto das multas aplicadas a condôminos inadimplentes. Para quem está na linha de frente da gestão condominial, as propostas dividem opiniões entre necessidade de modernização e risco de conflitos ainda maiores.

Síndica profissional há mais de uma década, Patrícia Gouveia vê com bons olhos a previsão expressa de exclusão do morador considerado antissocial, que hoje só é possível após decisão judicial e, muitas vezes, demora anos para ser concluída. “Tenho casos em que um único morador torna a vida de todo mundo um inferno: brigas, ameaças, som alto de madrugada. Se a assembleia puder deliberar pela exclusão, desde que respeitado o direito de defesa, isso vai ajudar a proteger a coletividade”, argumenta.

Já o advogado especialista em direito condominial Rafael Nogueira chama a atenção para a necessidade de critérios claros e cautela para evitar abusos. “A exclusão de condômino é medida extrema, que fere o direito de propriedade, protegido pela Constituição. É importante que o texto final da lei detalhe prazos, formas de defesa e, preferencialmente, mantenha a possibilidade de revisão judicial. Caso contrário, abre-se espaço para decisões passionais ou perseguições dentro de assembleias”, alerta.

Locações – Outro ponto que movimenta debates é a possibilidade de o condomínio proibir ou restringir locações de curtíssima temporada, como aquelas realizadas por meio de aplicativos de hospedagem. Para Patrícia, síndica de edifícios residenciais em regiões turísticas, essa mudança seria positiva. “Hoje, o entra e sai constante gera insegurança, dificulta o controle de acesso e prejudica até a convivência. Moradores permanentes reclamam com razão: quem está só de passagem não se preocupa com regras internas”, comenta.

Morador de um prédio na zona sul de São Paulo e investidor em locações de temporada, Felipe Andrade discorda. Ele teme que a nova regra acabe desvalorizando o imóvel e engessando o mercado. “A maioria dos proprietários faz isso de forma organizada, informando hóspedes e zelando pelo condomínio. Punir todos por conta de alguns casos de abuso é injusto. O ideal seria aprimorar regras internas, e não proibir de vez”, avalia.

Multa – Além dessas questões, o novo texto em discussão propõe aumentar o limite máximo da multa por inadimplência, de 2% para 5%. Para Rafael Nogueira, a medida atende a um pleito antigo dos síndicos, que veem o baixo percentual como incentivo ao atraso. “Com mais rigor, o condômino pensa duas vezes antes de atrasar. Mas é importante que isso venha acompanhado de campanhas de conscientização e acordos flexíveis para quem realmente passa por dificuldades financeiras”, acrescenta.

Enquanto o projeto segue em análise, a expectativa cresce entre gestores e moradores. Patrícia resume bem o sentimento de quem vive o dia a dia das assembleias. “O Código Civil de 2002 já não dá conta da realidade dos condomínios de hoje. As mudanças são necessárias, mas precisam vir com equilíbrio, para garantir a paz coletiva sem ferir direitos individuais”, analisa. Entre avanços e receios, todos concordam que a vida em condomínio precisa acompanhar o ritmo da sociedade, com mais diálogo, clareza e responsabilidade.