— A rotina dos condomínios mudou bastante, uma vez que o trânsito de pessoas desconhecidas deixa todo morador em alerta — diz Maria Helena Lopes, que atua como síndica há mais de 20 anos em diversos prédios residenciais e comerciais da região. — Condomínios não são hotéis, foram pensados para moradia. Isto está provocando um movimento entre síndicos e proprietários para estipular no regulamento interno algum tipo de sanção quando são cometidas irregularidades.
Para acompanhar e controlar o fluxo de pessoas, o Union Square, na Avenida José Wilker, na Barra, implantou uma tecnologia de verificação no seu bloco de suítes, um residencial com serviços. Quando o hóspede chega para a sua temporada, deve fazer check-in na portaria, momento em que recebe um cartão magnético para acessar o elevador e o apartamento alugado. O hóspede não consegue utilizar o equipamento sem o acessório, que funciona apenas para o andar do imóvel locado.
Além disso, no regulamento interno do prédio gerido pela Cipa Administradora, é determinado que o locatário deve ser recebido pelo proprietário do imóvel, de quem recebe pessoalmente as chaves. Todos os hóspedes daquele contrato devem ter o seu cadastro na recepção do prédio feito pelo dono do apartamento, tendo a portaria autorização para barrar depois a entrada de pessoas não listadas.
Coordenador da administradora, Bruno Gôuvea cita problemas comuns neste tipo de locação, além de barulho e excesso de visitantes.
— Na maior parte dos casos, o proprietário do imóvel disponível para locação está apenas preocupado em alugar o apartamento e resolver um problema de renda — pontua. — Quando consegue o cliente, pensa que a situação está resolvida e não leva em consideração o entorno, a comunidade. Acontece muito de hóspedes levarem garotas de programa ou usarem um imóvel para fazer fotos para a plataforma Only Fans. Isso é atividade comercial, e não residencial.
Alguns prédios estão decididos a recorrer à proibição. No condomínio Mandala, também na Barra, o residencial Quadra das Lagoas, na Rua General Renato Paquet, tem realizado assembleias com os moradores a fim de mudar a convenção para vedar totalmente locações por curta temporada realizadas por plataformas digitais.
A intenção começou a ser discutida após uma situação conflituosa ocorrida no final de 2023. Um dos apartamentos da cobertura foi alugado para seis pessoas, por um período de poucos dias. No entanto, sem conhecimento e consentimento do locatário, os hóspedes promoveram festas no imóvel, ocupando o lugar com uma quantidade de pessoas além do combinado e causando intensa movimentação no prédio, além de perturbarem os moradores com música alta fora do horário permitido. Diante do episódio, o síndico precisou acionar a polícia para acabar com a festa.
— Felizmente, o dono do apartamento tinha um contrato bem rigoroso e detalhado com a Airbnb. Faltavam ainda alguns dias para a locação terminar, mas ele a encerrou antes por conta das faltas praticadas — conta Julio Monteiro, síndico do Quadra das Lagoas.
Legislação permite proibir hospedagens
Especialista em direito imobiliário e condomínios, a advogada Renata Mansur aponta que a proibição dos aluguéis de curta temporada por prédios residenciais é um direito reconhecido pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
— O STJ reconheceu que condomínios podem proibir a locação de unidades por plataformas digitais como o Airbnb, desde que a convenção condominial tenha uma cláusula que estabeleça a destinação exclusivamente residencial das unidades. Isso significa dizer que tudo dependerá do texto da convenção e que a regra passa a valer a partir da sua data de registro — explica.
Em nota, o Airbnb afirma, no entanto, que a atividade já é regulamentada pela Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991) e que proibir essa locação viola o direito de propriedade de quem aluga seu imóvel.
Pelos dados do Secovi Rio, de março de 2024 a abril de 2025, o Recreio foi o bairro onde a oferta de aluguel de curta temporada por meio de plataformas eletrônicas mais cresceu, com aumento de 367%. Em seguida, vieram Barra, com aumento de 97,8%, e São Conrado, com 71,7%.
O tamanho deste mercado estimula novas formas de negócios. A startup carioca Lobie tem investido na administração de edifícios voltados para a atividade. A empresa tem na carteira 14 residenciais com serviços nos quais mais de 90% das unidades pertencem a investidores interessados em lucrar com estadias curtas. Lançado no bairro planejado Cidade Arte, na Barra, o residencial Arte Design será mais um cliente deste tipo.
Ernesto Otero, CEO da Lobie, afirma que este novo tipo de empreendimento tem a padronização devida para os aluguéis curtos:
— Nos residenciais comuns, a convenção é um pacto social, um combinado entre condomínio e proprietários de prédios em que as unidades foram vendidas para serem residenciais. Por isso há conflitos de interesse. Nestes empreendimentos, a convenção já deixa claro que as locações curtas são permitidas.
Um projeto de lei tramita na Câmara dos Vereadores do Rio com a proposta de regular os serviços de aluguéis de curta temporada por intermédio de plataformas. De autoria de Salvino Oliveira, prevê, entre as exigências, que o proprietário do imóvel mantenha uma base de dados digital de cada hóspede por, no mínimo, 90 dias.
Em audiência pública realizada em março, donos de imóveis que fazem esse tipo de locação protestaram, entre outros motivos, contra o que consideram burocratização excessiva da atividade. Na ocasião, Salvino afirmou que o ponto mais importante é que as pessoas se sintam seguras dentro de suas casas.
Fonte: O Globo https://oglobo.globo.com/rio/bairros/barra/noticia/2025/05/18/aumento-de-alugueis-por-plataformas-como-airbnb-faz-condominios-da-regiao-da-barra-criarem-novas-regras-ou-ate-proibirem-pratica.ghtml