Cuidados com a Lei Geral de Proteção de Dados e gravação de assembleias

Cuidados com a Lei Geral de Proteção de Dados e gravação de assembleias

Por André Resende – Jornalista

Publicada em 09/10/2025

A gravação de assembleias condominiais é uma prática que muitos síndicos vêm adotando em busca de maior transparência e segurança documental. Seja para registrar debates, votações, encaminhamentos ou para documentar decisões dos participantes para evitar desentendimentos futuros. Contudo, esse hábito, por mais útil que pareça, carrega implicações legais importantes, especialmente desde que a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), Lei nº 13.709/2018 em vigor.

Síndica em Curitiba, Luísa Moretti enfrentou esse dilema ao convocar uma assembleia para deliberar sobre obras emergenciais no prédio. Decidiu gravar toda a reunião, inclusive o momento em que condôminos levantam críticas muito pessoais ao projeto, e enviou a gravação depois para moradores ausentes. “Achei que fazia parte de prestar contas, mostrar o que foi discutido, quem falou o quê. Mas recebi mensagens dizendo que algumas pessoas se sentiram expostas; que não sabiam que seriam gravadas”, conta Luísa. Foi então que procurou a assessoria jurídica do condomínio para entender se essa gravação estava de acordo com a LGPD e com o direito à privacidade.

Cautela – Segundo especialistas e artigos jurídicos sobre o tema, a gravação de assembleias condominiais não é proibida, mas demanda cautela. Uma das explicações é de que esse registro pode “evitar conflitos, mas exige consentimento, registro em ata e conformidade com a LGPD”. Antes de iniciar a gravação, convém que o edital de convocação da assembleia já mencione que haverá gravação, explicando a forma que será feita (se será áudio, vídeo), e se será disponibilizado só aos presentes ou também aos ausentes, e, por fim, a finalidade. Assim, todos os condôminos ficam cientes de que participam de uma reunião gravada.

Outro ponto essencial é o consentimento dos participantes. Pode parecer óbvio, mas sob a LGPD, consentimento não pode ser tácito quando envolve gravação de som ou imagem: é necessário que seja livre, informado e com possibilidade de recusa ou manifestação contrária. Também é indispensável que se estabeleça um prazo de armazenamento da gravação, quem terá acesso ao conteúdo e como serão protegidos esses dados contra uso indevido. Se não houver nenhum desses cuidados, a utilização de gravações pode gerar litígios, inclusive ações judiciais por violação de privacidade ou de imagem.

Virtual – No caso de assembleias virtuais, as mesmas condições são válidas, porém com a atenção específica sobre a plataforma usada, que precisa assegurar confidencialidade, controle de acesso, e garantir que os dados de som, vídeo ou chat sejam armazenados em servidores seguros, com acesso restrito. Também se deve cuidar para que o sistema peça confirmação de leitura ou aceite dos participantes para gravação, antes do início da assembleia.

Luísa, depois de consultar advogado, revisou a convocação da próxima assembleia para incluir cláusula de gravação no edital, anunciou antecipadamente via circulares e no quadro de avisos, fez uma votação para aprovar o regimento interno que inclua regras quanto ao tratamento das gravações, e limitou o acesso da gravação apenas aos condôminos interessados. Ela percebeu que essas ações diminuíram bastante as queixas.

Legalmente, a LGPD exige que os dados pessoais (e isso inclui voz, imagem e gravações) sejam tratados com propósito legítimo, e que haja transparência. Se não for assim, o condomínio corre risco de responsabilidade civil por danos à imagem, eventuais multas pela autoridade de proteção de dados, e até obrigatoriedade de descartar ou bloquear o material.

Em resumo, registrar assembleias condominiais continua sendo uma ferramenta válida, mas só com respaldo jurídico, clareza sobre finalidade, consentimento dos participantes, segurança no tratamento dos dados e observância dos direitos à privacidade. Síndicos que ignorarem esses cuidados podem pensar que estão fazendo o certo, mas acabam expostos a riscos legais que podem custar mais caro do que os benefícios que esperavam assegurar.