Por Kênio Pereira – Diretor Regional de MG da Associação Brasileira dos Advogados do Mercado Imobiliário – Conselheiro do SECOVI-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG – kenio@keniopereiraadvogados.com.br
Publicada em 05/06/2025
Administrar um condomínio, especialmente os que necessitam de reformas ou os de grande porte, exige conhecimento jurídico específico para criação e utilização de fundos como o fundo de reserva, o fundo trabalhista e o fundo de obras. A correta previsão e aplicação desses mecanismos contribui para a transparência da gestão e a prevenção de litígios entre condôminos.
A finalidade do Fundo de Reserva é a garantia da boa conservação da edificação, cobertura de despesas emergenciais e realização de manutenções periódicas – como limpeza de fachadas, conservação de áreas comuns –, especialmente em edificações mais antigas que exigem reformas expressivas.
A convenção condominial, via de regra, estipula o percentual do fundo de reserva, podendo fixar limites máximos. Na ausência de previsão convencional, a assembleia poderá deliberar sua constituição com base no quórum de maioria simples dos presentes, nos termos do art. 1.350 do Código Civil, por se tratar de aprovação de receita ordinária.
Por uma questão lógica, a maioria dos condomínios calculam a taxa ordinária com valor fixo, sendo o fundo de reserva em torno de 10% da quota condominial, fazendo constar na ata o registro dos valores aprovados na assembleia, evitando assim polêmica, especialmente no caso de cobrança judicial de um inadimplente.
Também é prática haver a autorização para o síndico utilizar tal fundo em situações urgentes, tais como aumento de conta d’água ou energia elétrica, reposição de equipamentos, troca da bomba d’água, luminárias e etc.
Quando houver utilização do fundo de reservas para cobrir despesas que se enquadram como ordinárias, recomenda-se que a assembleia seguinte aprove sua recomposição, inclusive por meio de taxa extraordinária, se necessário, assegurando o equilíbrio financeiro dessa reserva financeira. Lembrando que caso o fundo seja utilizado para pagamento de despesas ordinárias, cabe ao inquilino contribuir para a sua reposição.
Fundo trabalhista – Desde 2010, temos defendido em palestras na OAB/MG a importância e imprescindibilidade da criação de um Fundo Trabalhista, cuja ausência acarreta em um equívoco nas contribuições. A prática errônea de cobrança de taxa extra no final do ano para pagar o 13º salário, implica em ônus desproporcional a moradores que não usufruíram integralmente da prestação de serviços durante todo o ano, tais como locatários ou proprietários que passaram a ocupar o apartamento, sala ou loja, por exemplo, em setembro. Isso porque, ao cobrar a taxa extra somente em dezembro, esse novo ocupante pagar os custos de janeiro a agosto que deveriam ter sido cobrados do morador anterior.
Para evitar essa cobrança a maior, deve a assembleia aprovar o Fundo Trabalhista como despesa ordinária, arrecadada mensalmente no mesmo boleto da quota condominial e do Fundo de Reserva. Dessa forma, provisiona-se 1/12 avos dos encargos trabalhistas mensais (13º salário, férias, encargos rescisórios, etc.), sobre o número de funcionários, assegurando a responsabilidade solidária de todos os condôminos que efetivamente se beneficiaram do serviço prestado.
Tal previsibilidade orçamentária também reduz os impactos financeiros em caso de rescisões contratuais, especialmente diante da alta rotatividade dos empregados em condomínio.
Distinções entre fundos – Todos os fundos condominiais podem ser aprovados pela maioria simples dos presentes, desde que vinculados à manutenção e operação do condomínio. O fundo de reserva pode ser utilizado de diversas formas, bastando a assembleia aprovar sua aplicação e sua fixação em valor compatível com o perfil do empreendimento.
Quanto ao Fundo Trabalhista, inexiste possibilidade de sua destinação ser alterada e sua composição (13º, férias, aviso prévio, etc), deve ser respeitada para evitar prejuízos, especialmente, no caso de mudança de moradores. Este fundo tem limite de arrecadação, sendo comum ter seu saldo reduzido expressivamente no final de dezembro. É importante realizar o seu recálculo sempre que os salários forem aumentados.
Fundo de obras – Já o fundo de obras deve ser instituído de forma apartada, mediante arrecadação específica por meio de taxa extra e finalidade exclusiva. Sua constituição deve ser deliberada em assembleia, com previsão de conta bancária autônoma. Nada impede que seja criada uma Taxa Específica para compra de um equipamento ou mobiliário.
Entretanto, para a realização de obras úteis e voluptuárias é necessário observar o quórum estipulado na convenção, sendo que inúmeros condomínios de maior porte sofrem desgastes com os quóruns confusos, estipulados de forma qualificada.
Conflitos – Em vários casos, para evitar polêmicas, inclusive com a falta de pagamento da taxa extra, se mostra importante atualizar a convenção para eliminar os erros decorrentes do vício de copiar modelos ultrapassados ou os artigos do Código Civil, sem entender a necessidade de adaptá-los às particularidades do empreendimento.
Para dividir a responsabilidade do síndico e aumentar a participação da coletividade, essa conta específica poderá ser gerida por uma comissão, a qual ficará encarregada de realizar os pagamentos, juntamente com a supervisão do síndico e da administradora. Dessa forma, será mais difícil surgir alguma dúvida sobre a lisura da realização da obra.
Sendo o condomínio administrado por quem não é proprietário de unidade, é aconselhável que a movimentação da conta do Fundo de Reserva/Obras, seja permitida somente a determinados conselheiros que tenham patrimônio, pois tal procedimento acarreta maior segurança.
Quóruns – Quanto ao quórum para aprovação da obra dependerá da convenção que, sendo bem redigida, não deixará dúvidas se o quórum será qualificado ou com base nos presentes à assembleia. Importante frisar que o próprio Código Civil autoriza a convenção estipular quóruns diferentes dos previstos no art. 1.341. Contudo, a prática demonstra que muitas convenções redigidas de forma confusa acabam por inviabilizar deliberações importantes, em razão de exigências rigorosas ou incompatíveis com a realidade de baixa participação nas assembleias.
Nesse caso, vale a pena investir na rerratificação da convenção por um advogado especializado, com vistas à atualização de suas cláusulas, inclusão de disposições práticas e adequação aos princípios de razoabilidade e eficiência para gestão da coletividade, regulamentando e tornando harmoniosa a convivência.