Por Kênio de Souza Pereira – Consultor Especial da Presidência da OAB-MG;
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Condominial da OAB Federal; Diretor Regional da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário; Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis – Tel. (31) 2516-7008 – kenio@keniopereiraadvogados.com.br
Publicado em 08/10/2025
Nos últimos anos, especialmente após a pandemia, a função de síndico profissional se tornou uma das que mais crescem no Brasil. A grande maioria dos síndicos é honesta e competente, mas como em qualquer atividade existem os aventureiros e mal intencionados. Como qualquer um pode se apresentar como síndico, aumentaram os casos de desvios, perseguições e até estelionatários que se aproveitam da confiança dos condôminos.
Muitos moradores elegem síndicos sem investigar sua idoneidade e vida pregressa. O síndico passa a ter acesso e poder sobre valores altíssimos. Não é raro um condomínio movimentar mais de um milhão de reais em obras, reformas e manutenções. Ainda assim, a escolha muitas vezes se baseia apenas em boa conversa. O resultado tem sido os desvios de recursos, contratação de prestadores parceiros em troca de comissões, obras desnecessárias e falta de firmeza na defesa dos interesses coletivos. Vários são os casos do síndico ou da administradora indicada pela construtora favorece-la ao deixar prescrever o direito de exigir os reparos dos vícios de construção.
Como quase todos os condôminos evitam assumir a sindicância ou o cargo de conselheiro por medo de aborrecimentos, abre-se espaço para qualquer pessoa ser eleita. Em muitos prédios, a prioridade é simplesmente “passar o problema adiante”, contratando alguém que se apresente bem, fale com facilidade e cobre valor baixo, sem investigar sua origem ou conduta anterior.
Investigação – \Nosso país é marcado por escândalos, notícias de golpes e esquemas ilegais, o que leva parte da população a normalizar essas situações. Entretanto, os condôminos esquecem que podem ser vítimas e que, frequentemente, os responsáveis pelos prejuízos não têm patrimônio para arcar com eles.
Apesar disso, a maioria dos condomínios não verifica se o candidato a síndico responde a processos de estelionato, cobrança ou execução, nem se tem restrições no SPC ou Serasa. Essa negligência equivale a entregar a administração de um cofre de dinheiro a quem não consegue gerir nem sua própria vida financeira.
É evidente a incoerência de manter na função alguém que responde a processos, mesmo sem condenação. O simples fato de haver investigação ou ação aceita pelo Ministério Público indica que deve ser evitado que essa pessoa administre recursos de dezenas ou centenas de famílias.
Mais absurdo ainda é quando condôminos ignoram esses riscos para aparentar generosidade, apoiando pessoas com histórico duvidoso. Se fosse para contratar essa pessoa para gerir sua própria empresa ou finanças pessoais, jamais fariam. Mesmo assim, aceitam colocar a coletividade em risco e, quando ocorre desfalque, negam sua omissão.
Risco – Eleger um condômino que possua patrimônio no próprio prédio é sempre mais seguro. Quem administra sabendo que qualquer falha pode desvalorizar sua sala, loja ou apartamento age com mais responsabilidade. Além disso, caso cometa excessos ou desvios, seus bens podem ser penhorados para arcar com indenizações.
Quando o escolhido não tem patrimônio, seja pessoa física ou jurídica, o risco aumenta. Essa pessoa sabe que, caso cometa falhas, contrate obras superfaturadas ou faça gastos indevidos, não terá como reparar os danos. Portanto, exige-se atenção redobrada antes de permitir que alguém sem vínculos patrimoniais assuma a função.
Um exemplo recente ocorreu em um condomínio que, após anos sob gestão de uma condômina, elegeu uma síndica profissional. Mal tomou posse, ela passou a agir arbitrariamente, realizando obras sem prestar contas. Em pouco tempo, consumiu todo o fundo de reserva em reformas superfaturadas. Posteriormente, os moradores descobriram que a empresa contratada para as obras era do marido da síndica profissional, que repetia esse esquema em outros condomínios desavisados para receber comissões dos seus parceiros.
Erro – Muitos brasileiros ainda tratam a sindicância de forma amadora e se constrangem em pedir documentos ao candidato, como se fosse descortesia. Esquecem que o síndico administrará valores elevados e que inexiste o dever de confiar em alguém. Essa falta de cuidado abre espaço para aventureiros e estelionatários, que dominam a oratória, conquistam simpatias e distribuem favores para se proteger.
Quando algum condômino mais atento tenta fiscalizar, não raro passa a ser perseguido. O síndico cria acusações falsas, distorce fatos e tenta manchar a imagem do denunciante para descredibilizar suas observações. Em muitos casos, estimula grupos rivais entre os moradores, transformando o condomínio em arena de conflitos para ocultar abusos e desvios.
Há ainda síndicos que ajuízam processos contra moradores que os fiscalizam, buscando qualificá-los como inimigos do condomínio. Quando, anos depois, os desvios são descobertos, a coletividade percebe o erro, mas já é tarde. Os prejuízos dificilmente são reparados, gerando sensação de impotência diante da manipulação sofrida.
E o Conselho? – Jamais se deve confiar a gestão do patrimônio coletivo a alguém cuja honestidade seja duvidosa. Integridade, idoneidade comprovada e ausência de restrições financeiras são requisitos indispensáveis para o exercício da sindicância. Sem isso, os riscos são enormes e recaem sobre todos os moradores.
O art. 1.356 do Código Civil determina que os conselheiros têm o dever de fiscalizar as contas do síndico. Entretanto, se preferirem se calar diante de irregularidades ou da notícia de que o síndico responde a processos por estelionato, podem ser responsabilizados como cúmplices.
Quando um síndico é flagrado cometendo desvios, muitas vezes alega que tudo era de conhecimento dos conselheiros. Em alguns casos, acabam condenados judicialmente por não terem tomado providências, mesmo alertados por vizinhos atentos. Por isso, a omissão e a conivência são extremamente perigosas. Aos conselheiros que apoiam um síndico de gestão duvidosa, fica o alerta: caso seja comprovado que foram acionados pelos condôminos para apurar a gestão do síndico e não tomaram providências, poderão ser responsabilizados pelos prejuízos, respondendo, inclusive, com seu próprio patrimônio.
Destituição – Muitos moradores bem-intencionados se equivocam ao tentar destituir um síndico ardiloso sem a devida orientação jurídica. Para alcançar êxito, é fundamental planejar com antecedência, reunir provas e seguir todos os procedimentos legais antes da assembleia.
Síndicos que agem de má-fé frequentemente contratam bons advogados para dificultar a destituição. Conseguem, em muitos casos, permanecer no cargo graças à falta de união dos condôminos e à ausência de assessoria profissional. Isso prolonga problemas que poderiam ser evitados com organização e acompanhamento jurídico especializado.